Há
um consenso sobre as crianças: que elas têm maior facilidade em
aprender, seja a tocar um instrumento musical ou a falar uma segunda
língua. Longe de mim querer refutar os estudos científicos sobre
aprendizagem, até pelo pouco que estudei sobre aquisição da
linguagem, reconheço que há dispositivos específicos do período
da infância, que permitem com maior facilidade o desenvolvimento de
certas habilidades. Quando adultos, naturalmente, o processo de
aprendizagem está mais enrijecido e, por isso, requer maior esforço
para obtê-lo. No entanto, tenho outro pensamento sobre essa questão,
o qual não anula em nada a ideia de que enquanto criança somos
realmente mais hábeis no aprendizado, mas que coloca em cheque o
quanto realmente é difícil criar quando já adultos.
Não
necessita de conhecimento científico para entender que na infância
há uma habilidade natural, necessária para que o ser humano
compreenda toda a configuração social na qual está inserido. Para
fazer parte da sua comunidade é preciso adquirir uma série de
significados e sentidos sobre as coisas. Daí para as questões
problemáticas acerca desses valores embutidos nesses conhecimentos é
um pulo, mas vou optar por me manter afastada dessas questões nesse
texto. O que eu quero tratar aqui é mais simples mas também tem sua
importância.
Vejamos,
gosto muito de escrever, desde que me entendo por gente lembro de
estar escrevendo histórias, anotando meus pensamentos e até
tentando compor umas músicas. Inclusive, sobre essa última, melhor
nem comentar. Hoje, eu ainda escrevo, muito menos que antes e, por
isso, sempre me pego pensando no motivo de minha produção ter
diminuído tanto. Por muito tempo acreditei que tinha a ver com o
fato de ter me tornado adulta, que provavelmente quando criança eu
tinha uma criatividade muito mais aflorada e facilidade em passar
para o papel. No entanto, esses dias aconteceu algo comigo que me fez
repensar tudo isso.
Uma
grande amiga, em mais uma de minhas tentativas de começar e terminar
um livro, teve um comportamento tão simples, mas tão significativo.
Ela decidiu ir além das palavras de incentivo e começou a
acompanhar minha história. Lendo, escrevendo publicamente palavras
de incentivo, se encantando pelas personagens e me mandando
recadinhos surpresas falando o quanto estava ansiosa sobre o desfecho
do romance. O impacto disso me fez entender qual era a maior
diferença entre a minha infância para quando me tornei adulta.
Ser
criança não era apenas deter de maior habilidades para criar e
aprender, era também ser incentivada de perto. Era não precisar de
aprovação, já que minhas produções estavam sempre incríveis e
isso me satisfazia ao ponto de querer fazer mais. Era ter leitores
atentos, dispostos a conhecer a narrativa, os personagens e os
desfechos. Era encontrar investidores, até financeiramente falando
nas minhas mais simples ideias. Era poder errar e não ser duramente
julgada, ao ponto de te causar bloqueios criativos.
Enquanto
adulta, escrever não é somente deixar a história fluir. É ter um
compromisso com a qualidade da escrita, não errar ortografia,
concordância, não ser vista como dona de uma história sem pé nem
cabeça, ou ser a adolescente demais, romântica demais… São
tantos julgamentos ao criar uma história, quando adulta, que a
vontade de continuar vai ficando de lado. Tantas preocupações
acabam dificultando a produção, anulando a vontade de desenvolver.
Sua família, seus amigos e até os conhecidos quando se dispõem a
te ouvir, querem saber antes de tudo sobre o que você está
escrevendo, seus motivos e quantas páginas já tem. Se for longo
demais, muitos desistem. Se for descritivo demais, eles pulam direto
para o final e fingem ter prestado atenção em tudo. Tem que escutar
sobre a quantidade de gente que está publicando, o mercado editorial
que é excludente e até lidar com o choque das pessoas, “você
quer escrever um livro?”. Como se as artes e a literatura fossem
feitas por extraterrestres, bem distantes do que, os comuns seres
humanos como eu, somos.
E
foi com todos esses pensamentos que eu conclui o motivo de ser mais
fácil para as crianças, não somente por serem criaturas especiais
mas também porque nós cultivamos a grosseira crença de que o apoio
não é para os adultos. A gente alimenta a ideia de que um adulto
não precisa ouvir coisas motivantes, precisam mesmo encarar que a
vida é dura não dá para perder tempo escrevendo romances bobos na
internet. O adulto, em nossa sociedade, pode sonhar, desde que seja
com ganhar dinheiro o suficiente para comprar uma casa e um carro do
ano.
Agora,
me digam, do que adianta ensinar às crianças que elas são capazes,
que elas podem ser o que quiserem, se depois vocês a olharão nos
olhos e serão os primeiros a colocarem obstáculos no caminho dos
seus sonhos?
PS:
Lai, obrigada por mais do que entender a Agnes, ser para mim como ela
é para Tione. Que sorte a minha.
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